Banalização do Estupro: Caso Chocante Expõe Falhas na Comunicação e na Justiça

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Normalização da violência sexual contra menor boliviana em programa de SP evidencia falha das plataformas e conduta negligente do mediador. Silêncio de entidades influentes de imigrantes em SP é questionado.

São Paulo • 18/08/25 às 15:52h
Atualizado • 20/08/25 às 12:27h

Um vídeo circulando em redes sociais e programas da comunidade boliviana em São Paulo trouxe à tona uma discussão perturbadora: a naturalização de um crime de estupro contra uma jovem em estado de embriaguez. Nas imagens, um entrevistador e o suposto agressor conversam como se o ato fosse uma mera inconveniência, chegando a sugerir, em tom sarcástico, que a vítima “deveria casar com o estuprador”. O caso, além de chocar pela crueldade, expõe a irresponsabilidade de comunicadores e plataformas que disseminam conteúdo sensível sem qualquer critério jurídico ou humano.
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“Ela mentiu a idade”: A Fala que Revela a Banalização do Crime

A vítima, uma adolescente boliviana, estava sob efeito de álcool quando o crime ocorreu. No diálogo veiculado, o suposto agressor, também boliviano, justifica o ato com a alegação de que a jovem teria omitido sua idade. O entrevistador, em vez de confrontá-lo com a gravidade da situação, trata o assunto com leveza, reforçando estereótipos perigosos, que normaliza o crime dentro de uma comunidade imigrante jovem.

Pela legislação brasileira (art. 217-A do Código Penal), mesmo que houvesse suposto “consentimento”, a relação sexual com menor configura estupro de vulnerável, crime inafiançável e imprescritível. Além disso, o fato de a vítima estar alcoolizada anula qualquer possibilidade de consentimento válido, conforme prevê a Lei 12.015/2009.
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Autoridade Boliviana Acionará Ministério Público Brasileiro

Uma autoridade boliviana no Brasil, ciente do caso, encaminhou o material ao Bolívia Cultural (12/08/25) e anunciou que, após as eleições gerais 2025 na Bolívia, formalizará uma denúncia ao Ministério Público brasileiro. Se a vítima for menor de idade, a queixa incluirá, tanto o produtor do conteúdo quanto a plataforma que o veiculou, por normalizar um crime hediondo e expor a vítima, prática que fere o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

“Transformar um estupro em piada é perpetuar a violência. A vítima, que já sofreu a agressão, ainda tem seu trauma banalizado publicamente”, denunciou a fonte, que solicitou reserva de identidade em razão do delicado momento político na Bolívia, em pleno processo eleitoral.

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O Silêncio Cúmplice das Redes Sociais

O vídeo chegou à redação do Bolívia Cultural em 12 de agosto, mas a identidade do programa e do entrevistado segue pública até a publicação desta nota, uma escolha do próprio produtor de conteúdo, que parece ignorar as consequências legais. Especialistas alertam que plataformas digitais, ao falharem na moderação desse tipo de conteúdo, tornam-se cúmplices indiretas da violência.

“Casos assim mostram como a desinformação e a falta de responsabilidade midiática perpetuam a cultura do estupro”, diz a advogada penalista Ana Lúcia Torres. “Não basta remover o vídeo; é preciso responsabilizar quem o produziu e quem lhe deu alcance.”

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“Ela estava bêbada”: O que diz a lei sobre estupro nessa condição?

A legislação brasileira é clara: o fato de a vítima estar alcoolizada ou sob efeito de outras substâncias não apenas não a responsabiliza pelo crime, como agrava a situação do agressor. De acordo com o Código Penal, o estupro de vulnerável (art. 217-A) configura-se quando a vítima, por qualquer motivo, não tem condições de oferecer resistência ou consentir de forma válida – seja por idade, deficiência ou estado de embriaguez. A pena para esse crime varia de 8 a 15 anos de prisão. Já no caso de estupro sem o agravante de vulnerabilidade (art. 213), a condenação prevê 6 a 10 anos de reclusão.

A lei não admite justificativas como “ela estava bêbada”“mentiu a idade” ou “não reagiu”. O estupro se caracteriza quando há constrangimento para a prática de conjunção carnal ou atos libidinosos, seja mediante força, grave ameaça ou incapacidade de consentimento, como é o caso de uma pessoa intoxicada. Nenhuma circunstância, nem o consumo de álcool, nem a roupa que a vítima usava, pode ser usada para atenuar a gravidade do crime.
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Justiça e Conscientização: Um Caminho Necessário

Não basta punir o agressor individualmente, é preciso responsabilizar quem banaliza o crime, seja em programas de entretenimento ou redes sociais. A vítima, já fragilizada pela violência sofrida, não pode ser ainda mais exposta ao escárnio público (mesmo sendo mencionada) .

A lei existe, mas sua aplicação exige um compromisso coletivo. Se testemunhar conteúdos que relativizem o estupro, denuncie. Se conhecer vítimas em situação de vulnerabilidade, ofereça apoio. A mudança começa quando a sociedade para de tolerar discursos que culpam as vítimas e passa a enxergar a violência sexual pelo que ela realmente é: um crime brutal, jamais uma piada.

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O Vergonhoso Silêncio dos Pseudo Poderosos: Apatia que Alimenta o Crime

Diante desse cenário de horror silencioso, onde o caso de uma menor se torna o símbolo gritante de milhares de vítimas invisíveis, a pergunta que marca fundo é: até quando? A omissão conivente desses pseudo poderosos, associações, federações e instituições que usam sua influência para tudo, “menos para proteger esta menor estuprada”, não é uma mera falha, mas cumplicidade ativa com a barbárie. A ética e a moral, valores que deveriam ser seu alicerce, foram soterrados por um pacto de silêncio que protege agressores e condena as vítimas ao abandono. Se a própria estrutura que deveria ser um porto seguro se cala por apatia e covardia, o que se pode esperar senão a perpetuação e banalização do horror? O grito de socorro dos sem voz da comunidade boliviana exige mais do que palavras; exige ação. Cabe agora à sociedade civil como um todo, transcendendo fronteiras, assumir a obrigação moral inadiável de repudiar, combater e erradicar essa chaga que corrói uma comunidade boliviana afogada na impunidade. Em quanto isso, o silêncio paira, denso e cúmplice, envolto no aroma nauseabundo do crime silenciado pela vergonha de uma sociedade muda.

Vídeo – divulgação

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